São Paulo da Cruz e o demônio

Vamos referir, com lhaneza, fatos extraordinários, indubitáveis e autênticos todavia.

Em França, os biógrafos de santos costumam, antes de entrar nesta matéria, fazer longas dissertações filosóficas, teológicas, etc... Precauções, pois estamos em épocas dos espíritos fortes.


Julgamo-nos dispensados desse trabalho por uma razão bem simples: os chamados espíritos fortes, ridicularizadores da crença nos demônios e dos exorcismos da Igreja, encontram-se diante de fatos que lhes pedem pelo menos sérias reflexões. Nos últimos tempos, Satanás teima em zombar de seus zombadores, com estranhos fenômenos, explicáveis somente pela intervenção real do espírito da mentira.


Serve-se a Providência muitas vezes do demônio para plasmar os santos.

A Paulo da Cruz não podia faltar esse traço de semelhança com Jesus Cristo, que entregou o corpo ao arbítrio de Satanás nas provações do deserto e ao chegar o PODER DAS TREVAS nos dias da Paixão.

É que Deus escolhera a Paulo, generoso atleta, para humilhar o gênio da soberba.


Jesus, dissera um dia ao nosso santo:

“Apraz-Me vê-lo sob os pés dos demônios”


Os espíritos infernais aproveitaram-se da permissão divina, já que a santidade de Paulo os exacerbava. Como vingança às derrotas sofridas, descarregavam-lhe todo o seu furor. Ouçamos ao nosso santo:


“O convento (do monte Argentário) está quase concluído. Espero inaugurá-lo na Quaresma. Oh! que alvoroço fazem os demônios! Somente Deus sabe como me acho”.


Os demônios, já o dissemos, destruíam de noite o que se edificava de dia.

“Faz muito tempo que o pobre ancião, ouve, à noite, assobios que o fazem tremer. Garantiram-lhe, porém, que tudo há de passar e nada o prejudicará. Não vos amedronteis, pois Nosso Senhor combaterá por vós. Alleluia! Alleluia! Alleluia! O demônio teme o ALLELUIA, palavra caída do Céu. Estou nas mãos da divina misericórdia, embora cruelmente atormentado pelos ministros de sua justiça e ainda mais pelos meus pecados ”.


Os ataques diabólicos, inspirados sempre na mais entranhada malícia, revestiam-se, por vezes, de caráter de intrigas mesquinhas e pueris. Em se tratando de prejudicar, não têm delicadeza esses inimigos. Todos os meios lhes parecem bons. Para o êxito de seus tétricos projetos, não se envergonham de metamorfosear-se em animais, não, porém, como Deus os criou: nisto está o embuste.


Justo castigo do orgulho, a ensinar-nos que toda criatura, por mais sublime que seja, em pretendendo sobrepujar-se a Deus, inferioriza-se aos irracionais. Apareciam-lhe freqüentemente sob horríveis formas, como de gatos selvagens, de cães raivosos ou de aves de rapina.


Para tornar mais divertidas suas artimanhas, aproveitavam do tempo em que Paulo estava enfermo e desamparado de Deus.


Após prolongadas insônias, conseguia Paulo pegar no sono. Pois bem, os espíritos malignos interrompiam-no, com assobios, uivos, espantosos ruídos, simulando detonações de diversas peças de artilharia a um tempo. Acordava o santo, sobressaltado. Outras vezes, tiravam-lhe os cobertores ou caminhavam sobre a cama, como gatos.

Na grave enfermidade de Orbetello, passou quarenta dias e quarenta noites insone, atormentado de pungentes dores. Afinal, acalmando-se-lhe um pouco os sofrimentos, adormeceu. Imediatamente, infernal ruído o acordou. Eram os demônios a abrirem e fecharem com violência as portas de um móvel... O santo, com ar de desprezo, pô-los em fuga, podendo descansar por algumas horas.

Ao referir a aventura ao confessor, ele, que sabia unir a alegria à virtude, dizia-lhe a sorrir:

“Que lhe parece? Não diz o provérbio que o cachorro que dorme não caça?... Um pobre homem insone há quarenta dias e quarenta noites, despertado no primeiro sono!... É isto, por ventura, agradável?”


Estava o santo de cama com o mal de gota. O demônio, a fim de martirizá-lo, tomou-lhe o dedo mais dolorido e o torceu violentamente, fazendo-lhe experimentar dores inauditas. Atacavam-no com mais furor, quando ocupado em afazeres da glória de Deus ou do bem das almas.


Ao começar a oração ou o Ofício divino, parecia-lhe desencadear-se o inferno... Se tomava da pena para escrever coisas de importância, o demônio, raivoso, rugia, espantosamente. Se nos recreios discorria de assuntos de piedade, de volta à cela tinha que haver-se com os espíritos infernais.


Ao rever as Regras das religiosas da Paixão, maltrataram-no os demônios a valer. Uma noite, mão invisível tomou-lhe da cabeça, batendo-a violentamente de encontro à parede. O barulho despertou o enfermeiro, na cela contígua. No dia seguinte, perguntando-lhe o confessor como passara a noite, respondeu, sorrindo:

“O bom Deus não permite que as artimanhas dos demônios façam muito mal, mas bem é que não fazem”. E acrescentou: “O que os queima agora é o mosteiro!”. O que mais irritava a Satanás era a conquista de almas. Nos primeiros anos de residência no Argentário, descia Paulo aos sábados a Portércole, a fim de instruir o povo nos rudimentos da religião, passando a noite ao pé do Tabernáculo. Os demônios esforçavam-se por amedrontá-lo com estrépitos infernais. O santo prosseguia a sua oração. De manhã, entregava-se às obras de apostolado com êxito correspondente à preparação.


Nas jornadas apostólicas, seguiam-nos os espíritos infernais, fazendo-lhe pagar bem caro as almas arrebatadas ao seu domínio.


À noite, batalhões desses espíritos entravam-lhe pelo quarto com alaridos de um povo amotinado. Puxavam-no da cama, arrastavam-no pelo assoalho, bradando enfurecidos:

“Ah! Vieste atormentar-nos? Quantas almas já nos arrebataste!...”


As meditações sobre a sagrada Paixão causavam-lhes grandes perdas. Confessaram pela boca dum possesso, que a santa missa celebrada pelo servo de Deus e a Paixão pregada por ele eram o que mais os afligiam.


O inocente corpo de Paulo, especialmente as pernas estavam sempre chagadas pelos açoites dos demônios.


Quantas manhãs encontravam-no pálido, lívido, obrigado a permanecer na cama, sem mover-se...


Regressava, certa feita, duma missão quando, ao sopé de alta montanha, nas vizinhanças de Feniglia, os demônios, de forma visível, colocando-se em ala ao longo da estrada, açoitaram-no cruelmente, como a soldado sujeito ao castigo das chibatadas.

Impossível referir todos os maus trato: infligidos pelos demônios ao servo de Deus; mas o apóstolo surgia sempre mais audaz desses combates e com a espada mais afiada para novas batalhas e novos triunfos...


Uma vez por outra tomavam os inimigos forma humana, pretendendo enganá-lo. Em Santo Anjo, na enfermidade de que falamos no princípio deste capítulo, apresentaram-se-lhe no quarto seis ou sete personagens, que se diziam médicos. Vinham da parte do pe. João Batista anunciar-lhe que se preparasse para a morte. O desenlace ocorreria na próxima quarta feira.


O santo, percebendo imediatamente o embuste diabólico, respondes-lhes que tinha médico em quem confiava plenamente e que, portanto, não fora necessário virem até o retiro por tão pouco. O dr. Mattioli tê-lo-ia avisado.

Com efeito, se aqueles médicos de nova linhagem pretendiam assustá-lo, enganavam-se redondamente, pois o maior desejo de Paulo era deixar este desterro e voar para a Pátria celeste. O certo, é que os demônios desapareceram, envergonhados.


Em outra ocasião, estavam o pe. Paulo e um companheiro hospedados em casa de um nosso benfeitor. Mal se recolheram ao quarto, apareceu-lhes o demônio sob a figura de horrível gigante. Pe. Paulo, perguntou tomado de susto o companheiro “Não está vendo?” “Tranqüilize-se”, respondeu o servo de Deus, acostumado a tais visitas, “tranqüilize-se, ele não veio para v. revcia”.


No dia seguinte percebeu o companheiro para quem viera o inimigo, ao observar as pernas do pe. Paulo lívidas pelos açoites recebidos durante a noite.


“Outros religiosos testemunharam as violências diabólicas no corpo inocente do pe. Paulo”, acrescenta são Vicente Maria Strambi, dando a entender, provavelmente, que ele também o testemunhara.


Que valor não demonstrou nesses assaltos o servo de Deus?! Ele bem sabia que contra tais inimigos não cabem temores, mas confiança ilimitada no poder e na misericórdia de Deus.


Jamais pediu socorro, patenteando ao inimigo que o não temia. Convencido de que o espírito soberbo tem mais audácia que poder, opunha-lhe somente profundo desprezo. Armava-se do Crucifixo, colocava ao pescoço o rosário e, com voz possante, intimava-o, em nome de Jesus e Maria, a retirar-se.


Fugia, não há dúvida, mas para voltar com desdobrado furor.

(Padre Luis Teresa de Jesus Agonizante, CP, in: Vida de São Paulo da Cruz, tradução do Padre Vicente do Nome de Jesus, CP, Editora “O Calvário”, São Paulo: 1958, páginas 363-367)



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