O episódio que São Marcos nos conta da legião de espíritos impuros que Jesus enviou para uma vara de porcos, libertando assim um homem possesso, é por todas as formas surpreendente. Pela descrição do suplício do possesso, pelo encontro de Jesus com ele numa região estranha, pela condescendência de Jesus para com os espíritos, pela profissão de fé dos espíritos e sobretudo pela atitude completamente díspar do homem e da multidão.
Depois da cura que Jesus operou e do desastre dos porcos, a multidão que vem das aldeias e dos campos pede a Jesus que se retire do seu território, que não os incomode mais nem provoque mais nenhum prejuízo. Estão dominados pelo interesse económico, pelo prejuízo sofrido, pela perda, incapazes de ver a salvação que Jesus tinha operado com aquele homem que eles mesmos temiam.
Estes homens, estes senhores dos porcos, acabam por se colocar nos antípodas dos espíritos impuros, pois esses ainda que espíritos impuros, provocadores do mal, prontos a serem vencidos por Jesus, foram capazes de reconhecer a salvação que se apresentava diante deles, o Filho de Deus. Pelo contrário estes homens não são capazes de qualquer pequena condescendência para com Jesus, não são capazes de ver, nem de reconhecer, apenas se querem ver livres dele.
Afinal desconhecem o que se tinha operado ali, a nova situação do homem que anteriormente estava possesso e agora se dispõe a seguir Jesus, a subir para a barca e ir com ele, a acção da graça salvadora de Jesus. Este homem sabe o que era o seu sofrimento anterior, sabe do que foi salvo, e por isso reconhece o seu salvador e quer acompanhá-lo, continuar a partilhar da liberdade da sua salvação.
Contudo, Jesus impede-o, devolve-o aos seus, à família, convida-o ao testemunho da salvação operada, e por isso o homem vai e pela Decápole anunciando o que Jesus tinha feito com ele, a salvação que era possível e de que ele era a prova.
Este convite também nos é feito a nós, a testemunharmos a salvação que Jesus operou connosco e opera em cada um de nós, mas muitas vezes tal como aqueles proprietários da vara dos porcos estamos mais preocupados com o que perdemos, com o prejuízo que podemos sofrer, do que com o bem que podemos ganhar, ou ver ganhar nos outros.
Muitas vezes também andemos cegos e não vemos o bem que Deus opera, a sua cura e a sua salvação, a libertação dos nossos espíritos impuros. Abre-nos Senhor os olhos e o coração para te acolhermos e avaliarmos os que nos fazes ganhar, a vitória que nos ofereces.
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