À mulher Deus lhe confia de uma maneira especial o homem: beato João Paulo II

A dignidade da mulher está intimamente ligada com o amor que ela recebe pelo próprio fato da sua feminilidade e também com o amor que ela, por sua vez, doa. Confirma-se assim a verdade sobre a pessoa e sobre o amor. Acerca da verdade da pessoa, deve-se uma vez mais recorrer ao Concílio Vaticano II: "O homem, a única criatura na terra que Deus quis por si mesma, não pode se encontrar plenamente senão por um dom sincero de si mesmo" (Constituição pastoral Gaudium et spes no. 24). Isto se refere a todo homem, como pessoa criada à imagem de Deus, quer homem quer mulher. A afirmação de natureza ontológica aqui contida está a indicar também a dimensão ética da vocação da pessoa. A mulher não pode se encontrar a si mesma senão doando amor aos outros.

Desde o "princípio" a mulher — como o homem — foi criada e "colocada" por Deus precisamente nesta ordem de amor. O pecado das origens não anulou esta ordem, não a apagou de modo irreversível. Provam-no as palavras bíblicas do Proto-Evangelho (cf. Livro do Gêneses 3, 15). [...] Também é preciso observar como a própria mulher, que chega a ser "paradigma" bíblico, se encontra também na perspectiva escatológica do mundo e do homem, expressa no Apocalipse (Cf. Apocalypse de São Ambrósio e De expositio symbolum De doctrina christiana) é "uma mulher vestida de sol", com a lua debaixo dos pés e uma coroa de estrelas sobre a cabeça (cf. Livro do Apocalipse 12, 1). Pode-se dizer: uma mulher à medida do cosmos, à medida de toda a obra da criação. Ao mesmo tempo, ela sofre "as dores e o tormento do parto" (Livro do Apocalipse 12, 2), como Eva "mãe de todos os viventes" (Livro do Gêneses 3, 20). Sofre também porque, "diante da mulher que está para dar à luz" (cf. Livro do Apocalipse 12, 4), se põe o "grande dragão, a serpente antiga" (Livro do Apocalipse 12, 9), conhecido já no Proto-Evangelho: o Maligno, "pai da mentira" e do pecado (cf. Evangelho de João 8, 44). De fato, a "serpente antiga" quer devorar "o filho". Se vemos neste texto o reflexo do Evangelho da infância (cf. Evangelho de São Mateus 2, 13. 16), podemos pensar que no paradigma bíblico da "mulher" está inscrita, desde o início a até ao fim da história, a luta contra o mal e contra o Maligno. Esta é também a luta pelo homem, pelo seu verdadeiro bem, pela sua salvação. Não quererá a Bíblia dizer-nos que precisamente na "mulher", Eva-Maria, a história registra uma luta dramática em favor de todo homem, a luta pelo seu fundamental "sim" ou "não" a Deus e ao seu desígnio eterno sobre o homem?

Se a dignidade da mulher testemunha o amor que ela recebe para, por sua vez, amar, o paradigma bíblico da "mulher" parece desvelar também qual seja a verdadeira ordem do amor que constitui a vocação da mesma mulher. Trata-se aqui da vocação no seu significado fundamental, pode-se dizer universal, que depois se concretiza e se exprime nas múltiplas "vocações" da mulher na Igreja e no mundo.

A força moral da mulher, a sua força espiritual une-se à consciência de que Deus lhe confia de uma maneira especial o homem, o ser humano. Naturalmente, Deus confia todo homem a todos e a cada um. Todavia, este ato de confiar refere-se de modo especial à mulher — precisamente pelo fato da sua feminilidade — e isso decide particularmente da sua vocação.

Inspirando-se nesta consciência e neste ato de confiança, a força moral da mulher exprime-se em numerosíssimas figuras femininas do Antigo Testamento, do tempo de Cristo, das épocas sucessivas, até aos nossos dias.

A mulher é forte pela consciência dessa missão, forte pelo fato de que Deus "lhe confia o homem", sempre e em todos os casos, até nas condições de discriminação social em que ela se possa encontrar. Esta consciência e esta vocação fundamental falam à mulher da dignidade que ela recebe de Deus mesmo, e isto a torna "forte" e consolida a sua vocação. Deste modo, a "mulher perfeita" (cf. Livro dos Provérbios 31, 10) torna-se um amparo insubstituível e uma fonte de força espiritual para os outros, que percebem as grandes energias do seu espírito. A estas "mulheres perfeitas" muito devem as suas famílias e, por vezes, inteiras Nações.

Na nossa época, os sucessos da ciência e da técnica consentem alcançar, num grau até agora desconhecido, um bem-estar material que, enquanto favorece alguns, conduz outros à marginalização. Desse modo, este progresso unilateral pode comportar também um gradual desaparecimento da sensibilidade pelo homem, por aquilo que é essencialmente humano. Neste sentido, sobretudo os nossos dias aguardam a manifestação daquele "gênio" da mulher que assegure a sensibilidade pelo homem em toda circunstância: pelo fato de ser homem! E porque a maior é a caridade (cf. 1 Carta aos Coríntios 13, 13).

Papa João Paulo II, carta apostólica Mulieris dignitatem, no. 30.
Roma, 15 de agosto de 1988.

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