Sobre os inocentes de Belém

Sobre os inocentes de Belém:

Ignoramos o número dos inocentes mas, segundo Macróbio, entre eles estava um filho de Herodes amamentado em Belém. E quem nos diz se o monarca assassino ainda sofreu quando soube da desgraça? Pouco depois devia ele deixar por sua vez a vida, acabrunhado de males vergonhosos; a vérmina roía-lhe os testículos, tinha os pés inchados, a respiração curta e um hálito insuportável. Sentindo-se repugnante a si próprio, tentou matar-se à mesa com uma faca. Morreu enfim ordenando a Salomé que desse a morte a numerosos jovens encerrados nas prisões.

A matança dos inocentes foi o último feito de Herodes. Este assassínio em massa ao redor de um berço inocente, o sangue derramado pelo recém-nascido que devia comprar com seu sangue o perdão dos culpados, este sacrifício humano em honra daquele que será crucificado, tem um sentido profético. Milhares de inocentes deverão morrer depois da sua morte, só pelo crime de terem crido na sua ressurreição; nascia destinado a sacrificar-se pelos outros, mas eis milhares de recém-nascidos a morrerem por ele como que para expiarem o seu nascimento. Há nesta oblação sangrenta, neste morticínio de puros, um tremendo mistério. Pertenciam à geração que devia trair e crucificar a Jesus. Morrendo nesse dia, aos golpes de Herodes, não viram morrer o seu Senhor. Sua morte os salvou e os salvou para sempre. Eram inocentes e permaneceram inocentes. Seus pais e seus irmãos vivos os vingarão um dia - mas serão perdoados "porque não sabem o que fazem".

Giovanni Papini, História de Cristo

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