O PAPEL DOS DOMINICANOS NA DEFESA DOS NATIVOS DURANTE A COLONIZAÇÃO NA AMÉRICA

O PAPEL DOS DOMINICANOS NA DEFESA DOS NATIVOS DURANTE A COLONIZAÇÃO NA AMÉRICA:

Dia 12 de dezembro é dia de N. S. de Guadalupe, padroeira do continente americano, por isso o blog da Paróquia São Domingos traz análises sobre a fé e o catolicismo na América Latina.

"Caravelas de Esperança" - Frei Matias
No dia 21 de dezembro celebra-se o V Centenário do sermão de Frei António de Montesinos, na ilha La Hispanyola (hoje Haiti e República Dominicana). Um sermão proferido no IV Domingo do Advento em nome de toda a comunidade dominicana. Esta ilha, a primeira terra encontrada por Colombo na sua tentativa da chegar à Índia, tinha dentro uma surpresa: nessa terra havia gente. Havia então um novo lugar onde encontrar riqueza para explorar e gente para cristianizar. Foi para esta segunda tarefa que os frades dominicanos foram enviados. A comunidade começara a formar-se pouco mais de um ano antes com a chegada dos primeiros três, entre eles Montesinos e o prior da comunidade, Pedro de Córdoba. Nos longos meses de travessia, entre o azul do mar e o azul do céu, tiveram tempo para relativizar o que deixavam para trás e projetar o que poderiam fazer naquelas novas terras. Mas não podiam imaginar que um ano depois, ao conhecerem os indígenas, iriam descobrir quem eram os espanhóis.
Os colonizadores tinham reduzido aquelas populações a uma situação de grande desumanidade: duros trabalhos sem descanso para arrancarem da terra o minério, alimentação escassa e fraca, doenças locais ou transportadas, sem lhes prestarem quaisquer cuidados. Para não comprometerem a sua liberdade de pregação, também aqueles frades viveram na penúria, com as mesmas choças por habitação e os mesmos escassos e magros alimentos. De uma sólida formação teológica e com um conhecimento direto do que ali se passava, puderam erguer a voz naquele domingo que antecedia o Natal e proclamar, parafraseando João Batista: eu sou a voz do que clama no deserto desta ilha. Aquela ilha era um deserto em humanidade.
A situação estava invertida: os infiéis não eram os indígenas, mas os espanhóis. Aos indígenas era preciso ensinar a fé. Era isso o que procuravam fazer, começando por lhes mostrar a imagem do Deus criador: “deveis saber que Deus vos fez a vós e também a nós e a todos quantos há neste mundo, para que o conheçamos… e amando-o nós a Ele, também Ele nos tenha como amigos… o que alcançareis se acreditardes nele e vos batizardes e tornardes cristãos e souberdes as coisas que os cristãos devem saber e acreditar e guardar”. Mas os espanhóis davam um exemplo contrário à sua fé, eram infiéis. Por essa razão, só poderiam participar na comunhão eucarística após confissão do seu pecado e mudança de vida. Como resistiam a essa mudança, não podiam receber a absolvição. Foi o que aconteceu, não lhes era dada.
A vida na ilha tinha-se tornado difícil. Os frades não podiam transmitir a fé àquela gente, sem tempo e esgotada com o trabalho, a fome e a doença. Os colonos não queriam admitir que aqueles povos tinham a mesma natureza humana que eles, para poderem explorar o seu trabalho sem restrições de consciência. Os frades consideravam que eram os espanhóis que estavam errados. Por isso foi grande o burburinho e a agitação após a proclamação daquele sermão do último domingo do Advento. No fim da missa a casa dos frades foi cercada para exigirem retratação. A resposta foi a promessa de um novo sermão no domingo seguinte, que os colonos pensavam ser de desculpas pelos exageros. Mas não, tiveram que ouvir o mesmo e com mais insistência ainda. Estas questões, fundadas no Evangelho, eram fáceis de compreender, mas não davam jeito nem na América nem em Espanha. Dizia o sermão:

…“com que direito e com que justiça tendes estes índios em tão cruel e horrível servidão? Com que autoridade fizestes tão detestáveis guerras a estas gentes que estavam nas suas terras, mansas e pacíficas, onde consumistes um número infindável delas com mortes e estragos nunca ouvidos? Como é que os tendes tão oprimidos e esgotados, sem lhes dar de comer nem curar as suas doenças, que pelos excessivos trabalhos a que os sujeitais vos morrem, melhor será dizer, os matais, para arrancarem e, conseguirem ouro todos os dias. E que cuidado tendes em que sejam doutrinados e conheçam o seu Deus e criador, sejam batizados, oiçam missa, guardem as festas e domingos? Estes não são homens? Não têm almas racionais? Não sois obrigados a amá-los como a vós mesmos? Não entendeis isto?”
Agência Ecclesia

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