DAR RAZÕES DA PRÓPRIA FÉ


“...FRUTO DA TRANSMISSÃO DA FÉ E DO ANÚNCIO DO EVANGELHO, QUE EM PRIMEIRO LUGAR NÃO DEIXA DE RENOVAR OS CRISTÃOS, AS SUAS COMUNIDADES, AO MESMO TEMPO QUE LEVA AO MUNDO O TESTEMUNHO DA FÉ CRISTÔ.

Na missão de anunciar e de transmitir a fé que compete a todo o cristão é prioridade da Igreja no dever de despertar a identidade batismal de cada um, para que saiba ser verdadeiro testemunho do Evangelho e saiba dar razão da própria fé. Todos os fiéis, em força do sacerdócio comum e da sua participação na função profética de Cristo, estão plenamente envolvidos nesta missão da Igreja. 

Aos fiéis leigos toca, em particular, testemunhar o modo como a fé cristã constitui uma resposta aos problemas existenciais que a vida coloca em cada tempo e em cada cultura e que, por isso, interessa a todo o ser humano, mesmo agnóstico ou não crente.

 Isto será possível se superar o espaço entre o Evangelho e a vida, reconstruindo na cotidiana atividade da família, do trabalho e da sociedade a unidade de uma vida que encontra no Evangelho a inspiração e a força para realizar-se em plenitude.

É necessário que cada cristão sinta-se interpelado por esta tarefa que a identidade batismal lhe confia, que se deixe guiar pelo Espírito, segundo a própria vocação, na resposta a tal missão. Num tempo em que a escolha da fé e do seguimento de Cristo é menos acessível e pouco compreensível pelo mundo, senão mesmo contrastada e hostilizada, aumenta a missão da comunidade e dos cristãos individuais em serem testemunhas do Evangelho. A lógica de semelhante comportamento é sugerida pelo apóstolo Pedro quando nos convida a darmos razões, a responder a quem nos pede razões da esperança que está em nós (cf. 1 Pe 3, 15). Uma nova estação para o testemunho da nossa fé, novas formas de resposta (apo-logia) a quem nos pede, a razão da nossa fé, são as estradas que o Espírito indica às nossas comunidades cristãs. Isto serve para nos renovarmos a nós mesmos, para tornar presente de modo mais incisivo no mundo em que vivemos a esperança e a salvação que nos deu Jesus Cristo. Trata-se de aprender um novo estilo, de responder “com mansidão e respeito, com uma reta consciência” (1 Pe 3, 16). É um convite a viver com aquela força suave que nos vem da nossa identidade de filhos de Deus, da união com Cristo no Espírito, da novidade que esta união gerou em nós, e com aquela determinação de quem sabe ter como meta o encontro com Deus Pai no seu Reino.

Este estilo deve ser integral, que abrace o pensamento e a ação, os comportamentos pessoais e o testemunho público, a vida interna das nossas comunidades e o seu zelo missionário. Assim se confirma a atenção educativa e a dedicação primorosa aos pobres, a capacidade de cada cristão em tomar a palavra nos ambientes onde vive e trabalha para comunicar o dom cristão da esperança. 

Este estilo deve fazer seu o ardor, a confiança e a liberdade de palavra que se manifestavam na pregação dos Apóstolos (cf. Act 4, 31; 9, 27-28). É este o estilo que coloca cada um de nós em jogo, como nos recorda Paulo VI: “ao lado da proclamação geral para todos do Evangelho, uma outra forma da sua transmissão, de pessoa a pessoa, continua a ser válida e importante. [...] Importaria, pois, que a urgência de anunciar a Boa Nova às multidões de homens, nunca fizesse esquecer esta forma de anúncio, pela qual a consciência pessoal de um homem é atingida, tocada por uma palavra realmente extraordinária que ele recebe de outro”.

Nesta perspectiva, o convite que nos foi endereçado no Ano da Fé a uma autêntica e renovada conversão ao Senhor, único Salvador do mundo, é uma oportunidade para aproveitarmos ao máximo, de modo a que cada comunidade cristã, cada batizado, possa ser o ramo que, levando fruto, é podado “para que dê mais fruto ainda” (Jo 15, 2); e possa assim enriquecer o mundo e a vida dos homens com os dons da vida nova plasmada na radical novidade da ressurreição. Na medida da sua livre disponibilidade, os pensamentos e os afetos, a mentalidade e o comportamento do homem são lentamente purificados e transformados, num caminho nunca terminado plenamente nesta vida. 

A “fé que atua pelo amor” (Gal 5, 6) transforma-se num novo critério de inteligência e de ação que muda toda a vida do Homem (cf. Ef4, 20-29), trazendo novos frutos.

Os frutos que esta transformação, apenas possível graças à vida de fé, gera no seio da Igreja como sinal da força vivificante do Evangelho ganham forma no confronto com os desafios do nosso tempo. As respostas indicam, do seguinte modo, esses frutos: famílias que são um verdadeiro sinal de amor, de partilha e de esperança aberta à vida; comunidades dotadas de um verdadeiro espírito ecumênico; a coragem de apoiar iniciativas de justiça social e solidariedade; a alegria de oferecer a própria vida seguindo uma vocação ou uma consagração. A Igreja, que transmite a sua fé na nova evangelização, em todos estes ambientes mostra o Espírito que a guia e transfigura a história.

Tal como a fé se manifesta na caridade, assim a caridade sem a fé seria filantropia. Fé e caridade, no cristão, exigem-se à partida, dado que uma sustenta a outra. Em várias respostas, sublinhou-se o valor testemunhal de muitos cristãos que dedicam a sua vida com amor a quem está só, marginalizado ou excluído, porque precisamente nestas pessoas reflete-se o rosto de Cristo. Graças à fé, podemos reconhecer em quantos pedem o nosso amor o rosto do Senhor ressuscitado: “Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim mesmo o fizestes” (Mt 25, 40). É a fé que permite reconhecer Cristo; é o seu amor que impele a socorrê-lo todas as vezes que se faz nosso próximo no caminho da vida.

Sustentados pela fé, olhamos com esperança para o nosso compromisso com o mundo, na espera de “novos céus e uma nova terra, onde habite a justiça” (2 Pe 3, 13). É o mesmo compromisso evangelizador a pedir-nos, como dizia Paulo VI, “de chegar a atingir e como que a modificar pela força do Evangelho os critérios de julgar, os valores que contam, os centros de interesse, as linhas de pensamento, as fontes inspiradoras e os modelos de vida da humanidade, que se apresentam em contraste com a Palavra de Deus e com o desígnio da salvação”. Muitas respostas pediam que se exortassem todos os batizados a viverem com maior dedicação a tarefa específica de evangelizar, mesmo através da Doutrina Social da Igreja, vivendo a sua fé no mundo, procurando o verdadeiro bem de todos, no respeito e na promoção da dignidade de cada pessoa, até intervir diretamente – particularmente os fieis leigos – na ação social e política.

A caridade é a linguagem onde, na nova evangelização, mais do que em palavras, se exprimem obras de fraternidade, de proximidade e de ajuda às pessoas com necessidades espirituais e materiais.
Uma prova de fogo de tais caminhos é seguramente o diálogo interreligioso, que não pode ter como condição a renúncia ao tema da verdade, que é um valor conatural à experiência religiosa: a procura de Deus é o ato que qualifica, em última instância, a liberdade do homem. Esta procura, contudo, é verdadeiramente livre quando se abre à verdade, a qual não se impõe com a violência, mas graças à força atrativa da própria verdade. 

Como afirma o Concílio Vaticano II: “a verdade deve ser buscada pelo modo que convém à dignidade da pessoa humana e da sua natureza social, isto é, por meio de uma busca livre, com a ajuda do magistério ou ensino, da comunicação e do diálogo, com os quais os homens dão a conhecer uns aos outros a verdade que encontraram ou julgam ter encontrado, a fim de se ajudarem mutuamente na inquirição da verdade; uma vez conhecida esta, deve-se aderir a ela com um firme assentimento pessoal”. Espera-se que o Sínodo releia o tema da evangelização, da transmissão da fé, à luz do princípio evidenciado pela verdade-liberdade.

Por fim, faz parte desta lógica do reconhecimento dos frutos também a coragem de denunciar as infidelidades e os escândalos que emergem das comunidades cristãs, como um sinal e conseqüência de uma quebra de tensão nesta missão de anúncio. É necessária a coragem de reconhecer as culpas, ao mesmo tempo que se continua a testemunhar Jesus Cristo e a contínua necessidade de se ser salvo. Como nos ensina o apóstolo Paulo, podemos olhar para as nossas fraquezas porque, deste modo, reconhecemos o poder de Cristo que nos salva (cf. 2 Cor 12, 9; Rm 7, 14s). A prática da penitência como conversão leva à purificação e à reparação das conseqüências dos erros, na certeza que a esperança que nos foi dada “não engana, porque o amor de Deus foi derramado nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5, 5). Tais perspectivas são fruto da transmissão da fé e do anúncio do Evangelho, que em primeiro lugar não deixa de renovar os cristãos, as suas comunidades, ao mesmo tempo que leva ao mundo o testemunho da fé cristã.

XIII ASSEMBLEIA GERAL ORDINÁRIA

A NOVA EVANGELIZAÇÃO
PARA A TRANSMISSÃO DA FÉ CRISTÃ
INSTRUMENTUM LABORIS
Cidade do Vaticano
2012



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