...E sereis como deuses, conhecendo o bem e o mal.

...E serei como deuses, conhecendo o bem e o mal.:
Recebo de uma amiga o seguinte cartão eletrônico de final de ano: 2012 - Vamos todos mentalizar que estaremos felizes, animados, prósperos e saudáveis.

A moça é profissional competente, de família abastada, e viaja o Brasil e o mundo. Contudo, ela nos deseja que “mentalizemos” coisas boas para o ano que se inicia. O que ela quer dizer com isso, supondo, como suponho, que ela esteja bem intencionada? Ora, fica claro que ela está dizendo que basta que mentalizemos e as coisas acontecerão. Basta que queiramos, para tudo acontecer. É a síndrome “Lair Ribeiro” que se revela na saudação de ano novo. Pense e acontecerá; seu pensamento tem o poder de criação; você tem poder criativo; pense apenas e tudo se modificará; você é como Deus.

O paganismo pós-cristão se expressa com a linguagem da nossa Religião e se diz muito moderno. Mas ele é tão velho quanto o mais antigo dos livros do Antigo Testamento: Porém a serpente disse à mulher: Vós de nenhum modo morrereis [se comerdes o fruto da Árvore do Conhecimento]. Mas Deus sabe que, em qualquer dia que comerdes dele, se abrirão os vossos olhos, e sereis como deuses, conhecendo do bem e do mal. (Gn 3,4-5.)

A “Árvore da ciência do bem e do mal”, diz os comentários da minha Bíblia,[1] é um símbolo “da faculdade de determinar o que é bem e o que é mal, privilégio reservado a Deus, única norma suprema à qual todas as leis e a consciência dos homens devem submeter-se. Os progenitores tentaram usurpar, com o pecado, esse privilégio de Deus. Visaram a ter a faculdade de decidirem por si mesmos o que é bom e o que é mau, sem ter que depender de Deus e assim a se tornarem autônomos moralmente. Com essa autonomia o homem negava o seu estado de criatura e subvertia a ordem estabelecida por Deus.”

Então, mentalizar para criar felicidade, ânimo, prosperidade e saúde é usurpar de Deus o poder de criador, é querer ser criador em vez de criatura, é querer decidir o que é bom e o que é mau, é subverter a ordem estabelecida por Deus.

Por outro lado, sabemos muito bem que nem sempre Deus quer – para nós, para o nosso próprio bem – que sejamos felizes, animados, prósperos e saudáveis. Quando os católicos desejamos “feliz ano novo” é sempre “feliz ano novo, se Deus assim o quiser”; senão, que seja como Deus quer. Se vier infelicidade, bendito seja Deus! Se vier retrocesso, bendito seja Deus! Se vier doença, bendito seja Deus!

Dizia São João de Ávila que mais vale um “bendito seja Deus” nos momentos difíceis do que mil ações de graças nos momentos felizes. Assim, se for para mentalizar alguma coisa, que seja você dizendo “bendito seja Deus” a tudo que lhe acontecer em 2012.

Rezemos pela conversão dos pagãos.


[1] Edições Paulinas, 1980. Trad. da Vulgata por Pe. Matos Soares.

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