Santo do dia 07 de janeiro: São Raimundo de Peñaforte – Iconografia


Celebramos hoje a memória de São Raimundo de Peñaforte e entres as suas representações iconográficas há uma que se distingue das outras, pois representa um dos milagres mais espectaculares deste santo dominicano. Uma vez mais fazemos uso do texto do “Agiológio Dominico” de frei Manuel de Lima, que nos conta esta história com o sabor do século dezoito.
Tinha El Rei naquele tempo trato ilícito com uma mulher. Repreendeu-o o Santo a primeira vez em particular; e porque ele se não emendou, antes mostrasse fazer gala do pecado, quando chegou a ser público no povo, o advertiu publicamente no púlpito: pedindo-lhe deixasse o mau estado, tão impróprio a um Príncipe Católico, pelo exemplo, e tão arriscado para a salvação.
Prometeu-lhe El Rei lançar fora a ocasião; mas como estava tão afeiçoado, não se resolvia a pôr em execução os saudáveis conselhos do Santo Confessor. Este vendo que lhe não obedecia, e que de outra sorte o não podia remediar, determinou deixá-lo, e tornar-se para o seu convento de Barcelona. Um dia o disse a El Rei, com o semblante tão severo, que admirando-se ele da resolução, e temendo ficar sem a sua companhia, mandou um decreto a todos os mestres dos barcos, e naus, que sob pena de morte nenhum desse passagem a Frei Raimundo.
Não sabia o Santo desta ordem. Uma noite depois de assistir a Matinas, tomada a bênção ao Prior, caminhou com o companheiro para o porto da cidade (estava na ilha de Maiorca com o rei); e achando nele uma nau, que estava de partida para Barcelona, se foi ter com o capitão, dizendo-lhe o recebesse. Ele lhe respondeu o não podia fazer: porque El Rei tinha mandado uma rigorosa ordem, para que o não levassem. Não replicou o humilde Religioso; sem dizer palavra foi às mais embarcações, que estavam para outras partes do reino; e como todos tinham a mesma ordem, em todos achou a própria repulsa.
Vendo a impossibilidade para a viagem, todo confiado em Deus, disse: “Imagina El Rei que há-de impedir a minha partida? Engana-se, que Deus me proverá de melhor embarcação”. Dito isto tirou a capa, e a estendeu sobre o mar; e pegando do bordão, se pôs sobre ela, fazendo o sinal da Cruz. Como se tivera entrado em uma fortíssima nau; chamou ao companheiro: este temendo o perigo, não quis acompanhá-lo. Disse-lhe então o Santo: “Voltai para o convento, e dizei ao prior que Deus me proveu de boa embarcação”.
Tomando uma parte da capa, e levantando-a sobre o bordão à maneira de vela, se sentou sobre a outra parte. Começou à vista de todos a soprar um ventozinho brando dentro da capa, e o levou pelo alto mar com tanta velocidade, que em menos de seis horas se achou à vista de Barcelona, sendo a viagem de cento e vinte milhas. Quando as vigias da torre descobriram ao mar a maravilhosa embarcação, pareceu-lhe que era uma nau: fizeram-lhe o sinal costumado para entrar; mas chegando-se pouco a pouco, viram era o Santo, que com tão estupendo milagre vinha na sua capa.
Concorreu multidão de povo, e não acabavam de crer o que viam. Cresceu a maravilha, vendo-se que chegando a terra a pé enxuto, levantava a capa da água, sem sinal dela; e pondo-a às costas caminhou para o convento seguido de inumerável gente, que ia como arrastada da admiração”. (1)

(1) LIMA, Frei Manuel de – Agiológio Dominico, Tomo Primeiro. Lisboa, Oficina de António Pedrozo Galram, 1709, 41.

Ilustração: São Raimundo sobre as águas.



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