Sobre a liberdade religiosa e o Magistério

Sobre a liberdade religiosa e o Magistério:

Quanto à contradição apontada pelos lefebvristas entre, por um lado, a doutrina sobre a liberdade religiosa tal como é apresentada na Declaração Dignitatis Humanae do Concílio Vaticano II e por outro, o que o Magistério ensina nas encíclicas Mirari Vos de Gregório XVI e Quanta Cura de Pio IX, tenho uma dúvida, sem dúvida provocada por minha indubitável ignorância. É sabido que o Magistério é infalível em questões de fé e de moral. Será também infalível em questões de política, ou estas se definiriam como matéria contingente, aberta ao debate? Pois parece claro que a liberdade de que trata Dignitatis Humanae é "a liberdade de coação na sociedade civil" (Compêndio, 1535), o que não parece ser uma questão de moral, mas de política. Salvo erro, naturalmente.

De qualquer forma, o problema parece vir de mais longe e não se limitar à Dignitatis Humanae, pois o mesmo PioXII, de saudosa memória, em "Con sempre nuova freschezza", mensagem de Natal de 1942, cita a liberdade religiosa entre os direitos da pessoa humana, num dos cinco pontos fundamentais para a ordem e a pacificação da sociedade humana dilacerada pela guerra:

"[Quem queira que a estrela da paz desponte e se detenha sobre a sociedade] apoie o respeito e a prática atuação dos seguintes direitos fundamentais da pessoa: o direito a manter e desenvolver a vida corporal, intelectual e moral e, em particular, o direito à formação e educação religiosa; o direito ao culto de Deus privado e público, inclusive a ação caritativa religiosa; o direito, em princípio, ao matrimônio etc."
[Enchiridion delle Encicliche 6, Pio XII, EDB, p. 1376, pár. 1704)

Além disso, vale lembrar que também no caso dos textos conciliares, como na leitura da Bíblia, não cabe o princípio da Sola Scriptura, ou seja uma relação direta entre a escrita e o leitor. Também aí a Igreja tem a exclusividade da interpretação de seus próprios textos. Não é porque o Concílio significou certa abertura em relação às seitas protestantes que devemos usar na hermenêutica do corpus conciliar de uma chave de leitura ortodoxamente protestante.

Quem já discutiu alguma vez com os evangélicos sabe que eles vêm sempre com uma listinha pronta de versículos bíblicos que à primeira vista contradizem o dogma católico, e é nestes casos que se faz necessário o recurso à interpretação da Igreja. Exatamente o que reivindica Bento XVI para os textos do CV2.

Kyrie eleison, Christe eleison, Kyrie eleison.

Nenhum comentário:

Arquivo